Vivendo no Canadá com João Rino

Foto 1. À esquerda: casa de alumínio recém adquirida por João; sua mulher junto à roseira sem espinhos e as tulipas plantadas próximas à sua garagem; à direita, com um amigo junto ao lago Eire e uma das enormes “green houses” (com plantação de tomates em vasos).
O LUGAR: Canadá.
Viajando sem neura: Há quanto tempo vive no Canadá?
João: Há quase 27 anos, na pequena cidade de Kingsville, que é próxima aos grandes lagos, quase divisa com os Estados Unidos.
Viajando sem neura: O que o fez decidir se mudar para lá?
João: Senti-me enviado por Deus. Como sou português e tenho o passaporte europeu, não precisei de visto, mas como queria entrar apenas legalmente, só fui para o Canadá depois de conseguir um contrato de trabalho. Depois de um tempo meu patrão entrou com o processo de emigração pois precisava de mim. Tornei-me cidadão canadense depois de 3 anos.
Viajando sem neura: No início, teve dificuldades com o idioma? Pagou muitos micos por isso?
João: Eu conhecia um pouco do idioma (inglês) e o estudei 2 horas por dia, 5 dias por semana, durante 6 meses mas, talvez por causa da idade, senti um pouco de dificuldade, tanto que paguei muitos micos sim, como quando fui pedir ovos e coloquei a mão no bumbum enquanto imitava uma galinha falando có có có có (rs).
Viajando sem neura: Que tipo de atividades (estudo/trabalho) desenvolveu (ou desenvolve) e o que diz sobre o nível salarial dessas atividades, em comparação com o Brasil? E sobre o custo de vida?
João: Minha esposa e eu já trabalhamos como boia-fria, com poda de árvores, apanhando frutas e legumes, com limpeza de indústrias, cuidando de crianças; o salário começou com U$ 7 a hora, chegando, posteriormente, a U$ 12. Enfim, pelo poder aquisitivo de lá, qualquer que fosse o trabalho todos íam com seus próprios carros. Posteriormente mudei-me para a avenida principal da cidade e então montei um comércio de frutas e legumes (foto), que funcionava assim: o freguês comprava e pagava sozinho e eu só ía lá à noite buscar o dinheiro. Atualmente estamos aposentados e passamos 6 meses no Canadá e 6 meses no Brasil. Todavia, durante todos esses anos também presto um trabalho missionário voluntário.
Viajando sem neura: Por algum momento arrependeu-se de ter ido?

Foto 2. Na casa de João: pé de ameixa, girassóis vermelhos, tomates-cereja, macieira e seu comércio (banca de frutas).
João: Jamais nos arrependemos de ter vindo; pelo contrário, às vezes até penso em voltar para o Brasil mas sinto-me sem coragem.
Viajando sem neura: Fale sobre algumas coisas boas que te surpreenderam e algumas que te decepcionaram desse lugar.
João: A segurança é algo que me surpreendeu aqui. As casas não são cercadas, nos postos de combustível não têm frentista (nós mesmos abastecemos o veículo), comprei uma casa com 25 anos de prazo para pagar e nem exigiram avalistas. O que me decepcionou foi a falta de calor humano: até entre familiares, para visitar alguém você precisa telefonar antes marcando o dia e a hora.
Viajando sem neura: Sente falta de alguma coisa do Brasil? Gostaria de voltar? Por quê?
João: Sinto falta da família, do calor humano e, como sou religioso, sinto falta também da fartura espiritual que há no Brasil. No entanto, como já falei acima, sempre que dá vontade de voltar eu desisto justamente pela qualidade de vida que temos aqui.
Viajando sem neura: Conte algumas curiosidades sobre, por exemplo, os costumes desse lugar.
João: Na minha cidade as quatros estações do ano são bem distintas: já chegou a 40ºC no verão (o normal é em torno dos 28ºC), e o inverno já chegou a -50ºC (mas a média é em torno de -25ºC). Por causa do clima, não há comércios com portas escancaradas devido ao sistema de aquecimento ou refrigeração; também não se vê animais soltos nas ruas, não tem vida noturna, não tem boteco ou casas de jogos (a não ser cassinos), em cada cidade tem um local exclusivo para comprar bebida alcoólica (e só para maiores de 18 anos), os nativos também passam anos sem acender o fogão pois só comem alimentos prontos, lanches, pizzas, galinha frita e muito refrigerante. O café deles é um tipo de “chafé” (colocam num copo enorme pela manhã e vão tomando durante todo o dia – alguns terminam só à noite), etc.
Viajando sem neura: Que conselhos você daria para quem esteja pensando em se mudar para lá ou ir à passeio?
João: a ideia da mudança é muito boa. O problema é que a maioria dos brasileiros que vêm para cá, preferem o tal “jeitinho brasileiro”, ou seja, entram como clandestinos e precisam ficar se escondendo da polícia e sujeitos a ganhar muito menos. Se vierem legalizados (como imigrantes), terão muitas regalias, não pagarão por nenhum tipo de tratamento de saúde como consultas, cirurgias, internação e, dependendo do emprego, nem pelos remédios.
Viajando sem neura: Outras considerações?

Foto 3. Em Vancouver, passeio de carruagem puxada por cavalos manga largas (de vez em quando passeio era interrompido para que pudessem colocar sacos para os cavalos fazerem suas necessidades fisiológicas) e entre os gansos que passeiam nas vias públicas.
João: Kingsville, considerada a capital do tomate (cada pé cultivado em vaso produz cerca de 35 quilos), tem uma história curiosa: havia um homem que se chamava Jak Miner (Joaquim Mineiro). Ele era presbiteriano e também gostava muito de animais silvestres, principalmente gansos. Antes de morrer fez um testamento deixando todos os seus bens (uma fazenda) para esses gansos. A Prefeitura então tomou conta de tudo: fez uns lagos artificiais e uma galeria à prova de som (auditório) na fazenda, plantou milho e arroz e começou a cuidar dos gansos. Em cada inverno reúnem-se mais de 35 mil gansos, sem contar os cisnes, os marrecos e os paturis de diversas qualidades. Hoje o lugar se chama Santuário dos Pássaros e tornou-se uma grande atração turística. A casa de Jak foi transformada num museu em sua homenagem, pois reúne seus pertences, inclusive sua bíblia.
Do grande lago Eire são retiradas, todos os dias, muitas toneladas de peixes. Suas praias também são bem requisitadas. Há, também, um jardim coberto chamado Jardim Tropical, no qual tem um pequeno zoológico onde acontecem, diariamente, alguns shows com animais adestrados, e onde se encontra muita diversidade de plantas e flores tropicais, assim como peixes e outros animais de países diversos. Aqui também tem alguns eventos famosos, como o Festival da Maçã, Festival da Uva, Desfile anual de tradições folclóricas, etc. A marina e as milhares de fazendas cobertas (chamadas green houses) são outros atrativos do lugar.
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